Por
No início de abril, soltamos um relatório em que dividíamos nossas angústias e chutes/estimativas em relação ao cenário brasileiro, após a chegada do coronavírus e a necessidade de isolamento social (para saber mais veja relatório completo). Passados mais de 2 meses, o cenário mudou, mas para pior. Não chegamos num colapso do sistema de saúde em nenhum estado brasileiro, mas estamos diante de mais de 30 mil mortes e mais de 600 mil infectados, com números em ascendência, com pouco (ou nenhum) sinal de estabilização. E, portanto, seguimos em isolamento social.
Verdade que alguns estados já começam a colocar as pontas dos pés nas ruas, mas São Paulo e Rio de Janeiro, estados com maior peso no PIB e também os mais acometidos pela Covid, ainda estão bem tímidos na reabertura; e enquanto esses não estiverem rodando, dificilmente falaremos em retomada da atividade econômica no Brasil.
O fato é que, conforme falamos no relatório anterior, quanto mais tempo de isolamento, maiores os danos à economia. Mas se sairmos do isolamento antes do necessário, o dano pode ser ainda maior. Temos que aceitar isso.
Assim, vamos atualizar os números e as ideias que relatamos no relatório anterior. Vamos lá?
Difícil apontar erros no meio de um furacão. O fato é que nossos governantes estão entre tentativas de acertos e erros. O que entendemos ser factível diante do tamanho da incerteza da situação que estamos vivendo. Mas a crítica que temos feito, desde quando toda essa loucura começou, é a falta de coordenação e cooperação entre poderes. Isso, além do cenário pandêmico, tem afetado, e muito, a confiança dos agentes, conforme gráficos a seguir:
O mundo clama por uma nova ordem mundial – falamos disso. Há dezenas de grupos de vários países investindo em tecnologia e saúde, com intuito de encontrar a cura ou uma vacina para a Covid-19, o que realmente desperta otimismo, já que parece que a teremos em tempo recorde. Contudo a política econômica, com destaque para a brasileira tem ido na contramão. Os mais centrados, clamam por cooperação e coordenação (não me canso de falar e escrever essas duas palavrinhas!) entre poderes para vencermos essa pandemia. A queda de braço que estamos vivendo (esfera federal e estadual, Governo e Congresso, Governo e STF, Governo e Governo) não só tira o foco do combate à pandemia, como também afugenta os investidores.
Além disso, quando comparamos o Brasil a outros países que foram duramente acometidos pela doença, destaco a desigualdade social que temos no nosso país. Nos países mais pobres, a condição sanitária tende a ser pior do que em desenvolvidos e a desigualdade social também grita; deixando os países emergentes numa condição mais desfavorável para lidar com o vírus. Vejam, segundo o Banco Mundial, no Brasil 88,3% das pessoas têm acesso ao básico serviço sanitário. Valor bem abaixo de países recentemente epicentro da doença (EUA é de 99,9%, Itália 98,8% por exemplo). Esse indicador pode servir como exemplo de que a luta contra a Covid 19 pode ser mais dura para emergentes, dado que a principal arma hoje é água e sabão, e isolamento social; e esse segundo, embora amplamente aplicado, sabemos que se depender das condições de moradia fica quase inviável.
Então a combinação de uma realidade mais dura e desigual somada a um cenário político bagunçado parece que fez com que o país, mesmo após quase 3 meses de isolamento social, ainda tenha um número crescente da doença, requerendo mais tempo de isolamento e, portanto, mais danos à economia.
Havíamos feito três “chutes” para o cenário brasileiro em 2020 no relatório anterior, e já estamos no cenário pessimista. Nesse, o isolamento terminaria em 30 de junho (pensando principalmente em SP e RJ), com total capacidade da economia voltando em 31 de agosto. Nesse contexto o PIB seria de -8,5% em 2020, inflação de 4,5%, taxa de juros a 2,00% e câmbio de cerca de 5,00 no final do ano.
Seguimos nessa ideia, com alguns ajustes: PIB ligeiramente pior, inflação bem mais baixa, e mantemos as expectativas para as taxas de juros e de câmbio. Achamos que o risco é assimétrico para baixo, uma vez que vemos possibilidade de um isolamento maior do que em “pares epicentros”. Se a curva de novos casos e mortes não se estabilizar e cair LOGO, haverá a necessidade de seguirmos em isolamento social após junho... O resto vocês já sabem.
Alguns colegas já se arriscam a estimar números para 2021. Eu ainda acho que o cenário está demasiado nublado para isso. Mal conseguimos ver a próxima semana, quem dirá o próximo ano. Mas segundo estimativas de mercado, a economia se recupera em 3,5% em 2021. Ainda a ver se será em U, L, V, W ou qualquer outra letra que lhes agrade.
O cenário inflacionário está sob controle e não enxergamos uma explosão da inflação mesmo com um câmbio tão desvalorizado, justamente por conta do baixo nível de atividade econômica. Ou seja, com as pessoas consumindo pouco, não há estímulos para aumentar os preços. Mesmo os alimentos, que têm forte peso no índice, não parecem sofrer choque de demanda, como havíamos imaginado. Com isso, a inflação em 2020 deve ficar na casa dos 2,7%.
Políticas monetárias expansionistas serão vistas a torto e a direito. Épocas de crise requerem choques de demanda e, para tanto, veremos em todos os cenários quedas adicionais da taxa de juros. Não vemos, contudo, taxas chegando a zero como em outros países porque a política fiscal deve atuar de forma mais significativa. A taxa Selic deve ficar em 2% neste ano.
Infelizmente, a severidade da recessão está ligada ao tempo que a atividade econômica estiver parada e seu tempo de retorno. Entendemos que a volta será cautelosa, ou seja, não vamos ver as pessoas entupindo shoppings e restaurantes no dia seguinte ao final do isolamento; entendemos que as regras de isolamento serão flexionadas aos poucos a partir do final de junho, sobretudo em SP e RJ, maiores pesos do PIB. Projetamos PIB de -9% neste ano e acreditamos que o mercado, que hoje prevê -6,48%, continue revendo suas expectativas para baixo.
A taxa de câmbio deve encerrar o ano perto de US$/R$ 5,00 ou menos, pois há muito a se desenrolar até lá. Por um lado, itens ligados a risco país – como cenário político – podem atrapalhar. Por outro lado, o cenário externo mais benigno – Europa e EUA já apontam para o final da pandemia com sucesso na reabertura de suas economias – pode levar a uma melhora nos preços dos ativos e, portanto, a um descolamento dos aspectos conjunturais locais.
Nossa visão setorial não se alterou desde o último relatório. Naquela ocasião, separamos os setores em quatro blocos:
Além disso, não podemos nos esquecer da importância que o agronegócio terá para a balança comercial brasileira. Esse deverá ser o setor mais beneficiado após a pandemia, afinal o mundo irá precisar mais do que nunca de grãos, de comida. Assim, é claro que a pandemia deixará sequelas graves para vários setores, mas aqueles que souberem se reinventar, poderão se sobressair lá na frente. E ao Brasil cabe saber aproveitar o bom momento que o agronegócio irá desfrutar para, quem sabe, tentar conter minimamente toda a recessão que virá por conta de setores como o industrial e de serviços.
Seguimos num cenário bastante adverso e muito difícil de prever. A pandemia é um elemento surpresa que pode mudar análises repentinamente. O fato é que estamos pessimistas com a evolução da doença no país e com a estratégia dos governantes até o momento. Não enxergamos planos efetivos, e vemos muita falta de cooperação entre poderes, impedindo maiores coordenações/ organização.
Ainda acreditamos muito na ciência, aliás esse fator (tratamento ou vacina antes do esperado) é o que pode dar uma reviravolta no cenário, sobretudo na confiança dos agentes, item extremamente importante para a recuperação econômica pós-isolamento social.
De qualquer modo, deixamos aqui a nota de que essa crise, além de piorar muito os indicadores econômicos levantará a bandeira de como nosso país é desigual. Estamos pagando esse preço? Me parece que sim.
Um resumo dos principais acontecimentos de cada dia que podem influenciar na taxa de câmbio, tudo isso em menos de 1 minuto.
ouça agora