Relátórios de economia
3/11/2022

Câmbio daqui para frente: pontos positivos e pontos negativos

Por

Fernanda Consorte

Cristiane Quartaroli

Fazer estimativas econômicas nunca foi fácil e o ambiente atual, considerando tanto o cenário doméstico como o cenário externo, deixa as expectativas ainda mais flexíveis. O fato é que há argumento para todos os lados. Desta forma, listamos neste relatório pontos positivos e negativos que podem influenciar a taxa de câmbio brasileira nas próximas semanas. A volatilidade e a amplitude podem ser menores, conforme falaremos abaixo, mas a tendência ainda não está definida.

No último domingo, tivemos o resultado da eleição presidencial de 2022 no Brasil, que foi a mais disputada do País desde o início da redemocratização. O candidato Lula (PT) obteve 50,9% dos votos válidos (60,3 milhões de eleitores), enquanto o atual presidente Jair Bolsonaro (PL) obteve 49,1% dos votos (58,2 milhões). Além disso, vale destacar que 12 governadores eleitos apoiam o candidato Lula, enquanto nos demais estados (15 no total), o candidato eleito ao governo é da base aliada a do presidente Bolsonaro. Ou seja, o resultado dessa eleição confirma o fato de que o cenário pode continuar sendo de grande polarização no País.

Ao longo das últimas semanas, falou-se muito em aversão ao risco e nível elevado de incerteza no Brasil por conta da corrida eleitoral, o que acabou se traduzindo em pressão na nossa taxa de câmbio e nos demais ativos, como Bolsa e juros. Do início, até meados desse ano, a taxa de câmbio apreciou cerca de 5,9%, mas durante o período eleitoral, ou seja, do início das campanhas em agosto até o final do segundo turno, o câmbio depreciou quase 4%. Fora a volatilidade, em que vimos variações para cima e para baixo de mais de 70 centavos em poucos dias, veja o gráfico abaixo.

Olhando à frente, por um lado, alguns pontos podem gerar uma tendência de queda da taxa de câmbio no curto prazo, assim como temos visto nesses últimos dias desde o resultado das eleições, tais como:

1. O primeiro, e mais importante, é que logo após eleições presidenciais é comum termos um momento de calmaria e positividade nos mercados ,e isso, geralmente, independe do resultado. Basicamente, porque a nuvem de incerteza que rondou os mercados por meses a fio começa a clarear, já que temos a informação efetiva de quem irá governar o País no próximo ano. Além disso, a volatilidade também costumar diminuir em anos não eleitorais (veja gráfico a seguir).

2. Seguindo o ponto 1, um cenário doméstico mais calmo pode sugerir, ao menos à primeira vista, maior entrada de fluxo de capital, diante de uma expectativa de boa coordenação entre países.

3. Além disso, o mercado espera que o presidente eleito de sinais de um comando mais pró-mercado, a partir das escolhas de ministros específicos. Alguns noticiários já sugerem que Lula deverá nomear representantes pertencentes aos partidos mais de centro para compor as casas mais ligadas à economia, por exemplo. Vamos aguardar.

Por outro lado, não vemos um céu de brigadeiro. Dúvidas ainda estarão rondando as expectativas dos agentes de mercado, mesmo no período de transição de governo, o que pode gerar ainda volatilidade nos ativos. Vale lembrar que temos alguns riscos a considerar, tanto internamente, quanto no cenário externo.

1.  A composição eleita em nosso Congresso concentra uma maioria de partidos mais à direta. O PL, por exemplo, consolidou nessas eleições a posição de maior bancada tanto na Câmara, com 194 deputados eleitos, quanto no Senado, com 24 senadores eleitos. Já os membros que  declaradamente apoiam o governo eleito somam 144 na Câmara e 15 no Senado (ver figura abaixo). Ou seja, será necessário poder de manobra grande por parte do próximo governo para aprovação de matérias que exijam a maioria absoluta da casa (257 deputados) ou maioria constitucional (308). Esse obstáculo pode afetar a leitura institucional do Brasil por parte de investidores.

2. Por fim e extremamente importante, temos outro fator de risco que é o cenário externo. Como já falamos algumas vezes, países emergentes são muito dependentes e reagentes aos movimentos dos países desenvolvidos.

a. Temos uma guerra ainda em curso, que tem causado sérios problemas de abastecimento em países da Europa, principalmente, mas que reflete em aumento nos preços de algumas commodities e preocupação com risco de recessão em diversos países.

b. A China ainda está enfrentando problemas decorrentes da pandemia, revisões para baixo do crescimento da economia chinesa são constantes e muito devido aos frequentes lockdowns aplicados por lá. Isso tem impacto relevante - e negativo – para as economias emergentes.

c. E temos um quadro de aumento de juros nos EUA por conta do elevado nível de inflação que o país enfrenta, o que pode gerar forte desaceleração econômica. Lembrando que aumento nos juros americanos reflete de forma negativa em países emergentes, sobretudo no comportamento de nossas moedas. Os gráficos abaixo ilustram esses pontos.

Desta forma, se por um lado podemos esperar uma melhora no quadro interno com a redução de algumas incertezas, por outro, ainda há fatores que devem continuar trazendo volatilidade para os ativos brasileiros e, principalmente, para nossa taxa de câmbio. Esperamos continuidade de alívio no curtíssimo prazo, pelos motivos sinalizados no início deste relatório. Mas não podemos ignorar os riscos associados às expectativas de eventual dificuldade que o novo governo irá enfrentar no Congresso a partir de 2023 e, sobretudo, pelo ainda nebuloso cenário externo. Uma melhora sim, mas com cautela.

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