Relátórios de economia
30/4/2025

Fluxo, taxa de câmbio e um pouco de cautela

Por

Cristiane Quartaroli

Entra ano, sai ano, voltamos a escrever sobre os indicadores de fluxo de capital no Brasil. Primeiro, porque acreditamos ser uma variável importante para quem trabalha com câmbio (além de outras coisinhas mais, claro!), mas, também, por ser um tema que carece de atualização e avaliações constantes. Vivemos em um mundo globalizado com um grande fluxo de capital, ou seja, transações financeiras como compra e venda de ações de empresas, títulos e moedas, etc.  As transações que ocorrem hoje em tempo real estão no dia a dia das instituições financeiras e cada vez mais no dia a dia das pessoas físicas. Na maioria das vezes, são operações feitas em dólar, ou seja, impactam diretamente na cotação da moeda, não tem jeito. Quanto maior o fluxo de capital (ou seja, dólares) vindo para o Brasil, menor a cotação e o contrário também é verdadeiro. É a lei básica da economia: quanto maior a oferta, menor o preço e vice-versa!

                                           
Mas bora lá, voltemos ao fluxo e vamos lembrar um pouco do que aconteceu no passado recente (que parece que já foi há muito tempo, mas tudo bem). 2024 foi um ano marcado por incertezas e volatilidades devido às questões geopolíticas envolvendo as guerras no Leste Europeu e Oriente Médio, além de diversos outros conflitos em regiões como Mianmar, Sudão e Síria. Com isso, observou-se certa instabilidade no fluxo de investimentos no mundo, motivada pela falta de previsibilidade que esses conflitos impunham. Para se ter uma ideia, de acordo com dados da Unctad, United Nations Conference on Trade and Development (ver relatório), o fluxo de Investimento Estrangeiro Direto (IED) global caiu 8% em 2024, desconsiderando os fluxos financeiros por meio de economias de intermediação europeias. Contudo se incluirmos essas economias, o IED global alcançou aproximadamente US$1,4 trilhão, um aumento de11% em relação a 2023. Já para países em desenvolvimento (alô Brasil), o IED caiu 2% em 2024, marcando o segundo ano consecutivo de queda e justificando parte da desvalorização que as moedas desses países tiveram naquele ano (ver gráfico).

Mas e agora em 2025? O que podemos falar sobre o Brasil, já que temos informações disponíveis, é que, contrariando a intuição, nossa taxa de câmbio se valorizou pouco mais de 7% no primeiro trimestre do ano, o fluxo seguiu no vermelho e o país registrou a maior saída de dólares da história! Foram nada menos que US$15,8 bilhões que deixaram nossa economia (ver gráfico). É como se um bloco inteiro de foliões internacionais tivesse saído da avenida antes mesmo da escola de samba começar a tocar (#saudades do carnaval que fala?) — clima de desânimo total #oioutono, folhas caindo, fluxo saindo...

O grande destaque veio mesmo em março, quando vimos uma retirada de US$8,3 bilhões, puxada principalmente pelo canal financeiro, responsável por uma redução de mais de US$12 bilhões. Contudo o fluxo comercial tentou segurar as pontas com uma entrada líquida de US$4,5 bilhões, mas foi como o famoso “tapar o sol com a peneira”: não deu conta de suprir toda a saída do fluxo financeiro. Com isso, fechamos o mês no vermelho. Para se ter uma ideia, no auge da pandemia, em março de 2020, a saída foi menor do que a observada nos dias atuais, de pouco mais de US$6,6 bilhões. E, com isso, acumulamos uma saída de quase US$40 bilhões nos últimos doze meses – é muita coisa. Curiosamente, o câmbio se valorizou nos dados mais recentes (ver gráfico) – normalmente essa relação é inversa.

Mas o que esperar para o restante do ano, diante de tantas adversidades que 2025 já está nos proporcionando? Em nossa visão, as perspectivas são moderadamente positivas, embora ainda estejam cercadas por desafios internos e externos. A expectativa de estabilidade no crescimento econômico global e a possível redução das taxas de juros em algumas economias pode favorecer a entrada de investimentos estrangeiros no país, especialmente, em setores ligados à infraestrutura, energia renovável, tecnologia e agronegócio.

Vale destacar que o Brasil continua sendo um destino atrativo para o Investimento Estrangeiro Direto (IED), impulsionado por seu vasto mercado interno, riqueza de recursos naturais e projetos ligados à transição energética – que talvez seja o grande tema da vez! A retomada de grandes projetos de infraestrutura e o fortalecimento das cadeias produtivas locais também devem estimular novos aportes, especialmente se houver avanços na melhoria do ambiente regulatório e na segurança jurídica.

Contudo fatores como a volatilidade cambial, incertezas fiscais, riscos políticos e a concorrência com outros mercados emergentes podem limitar a intensidade desse movimento. Além disso, o cenário geopolítico global e eventuais reconfigurações nas cadeias de suprimentos internacionais, por conta da guerra comercial entre EUA e China, devem seguir influenciando as decisões dos investidores. Para potencializar o fluxo de capital, o Brasil precisará manter uma agenda de reformas, garantir estabilidade macroeconômica e promover políticas públicas que incentivem investimentos sustentáveis e de longo prazo.

Conclusão: Embora o primeiro trimestre de 2025 tenha começado com um forte desafio no que diz respeito ao ingresso de fluxo de capitais, as perspectivas para o restante do ano ainda guardam certo otimismo — mas com a cautela que o momento exige. O Brasil segue com potencial para atrair investimentos, especialmente, se avançar nas reformas estruturais e souber aproveitar as oportunidades da nova economia verde e tecnológica. Em um cenário global, repleto de incertezas, o sucesso em reverter a saída de dólares e reconquistar a confiança dos investidores dependerá, mais do que nunca, da nossa capacidade de promover estabilidade, previsibilidade e um ambiente de negócios mais competitivo. Seguimos acompanhando!

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